sábado, 16 de maio de 2015

O que há de você na tarde

Picture by Harry Ekman


























Errar pelas gramas secas,
por alamedas,
e orlas
Perseguir pregos enferrujados
e algumas mariposas
rotas,
também daquela cor

Descobrir conluios
Reparar,
entre os indivíduos que recolhem ervas,
e verbas
e versos daninhos,
certos insetos cínicos
de uma imoral imortalidade

Parece
que pra se fazer eterno, tarde afora,
só inseto tem ciência
(criatura simples, 
que nem gente,
nem nunca 
não vai saber)

É preciso afrouxar, 
com jeito, silêncio
e candura,
o laço lento da tarde 
e seu sunset de cetim

Depois convocar vaga-lumes
com uma penca de pardais
Chamar dois vira-latas,
com seus dois homens de bem
pra cegar o lusco-fusco,
pra serenar as varandas,
pra calar a cigarra
que excita os colegiais

Tem que ir, sem dinheiro e sem armas
lá pra lugares ermos
e gente pouca,
onde corre uma brisa
miúda,
úmida,
sem calcinhas,
que enlambece a crista dos tempos
e arrepia capinzais

Lá,
tem raízes apodrecidas
que se esfacelam
em três ou quatro ilusões
Lá caem pedaços de céu
estrelado,
salpicado
pela caspa divina de Deus
Lá um sapo desses,
de varejo,
que já mija sem veneno,
sem vergonha,
sem ninguém,
se compadece das ruas,
e vestes,
e botas
dos peregrinos e generais

Do ocaso ao acaso,
com sossegos, 
sem censuras,
se acabrunham as penumbras,
encolhem-se as calçadas,
e as tocaias fenecem

A bunda se assenta no chão,
em colos de mãe,
em balanços,
em placidez
Depois,
feito poste,
pinheiro,
honradez,
a cabeça se endireita,
se aprumam as costas,
e o silêncio cai

Caem cortinas, 
cai também um grilo,
sem um grito,
mudo,
nu,
nesta sopa rala de vida

O tiritar perpétuo é engolido a colheradas,
com devoção,
fé,
fome
e coentro
Se sacia o ser que sofre,
se sacia o ser que sorve
o inseto e seu silêncio
servil

Permanece o sibilar constante,
e os vasos nas janelas,
e as flores,
e as virgens,
e blocos de concreto
Permanecem,
na eternidade terna da tarde,
fantasmas, 
e amores, 
e desejos
e a prova, 
e o almíscar
que você deixou por aqui