segunda-feira, 2 de março de 2015

51 coisas que eu aprendi em 51 anos de vida


Em outubro do ano passado, ao completar 51 anos de idade, resolvi enumerar 51 coisas que eu aprendi da vida, do mundo, das relações humanas, dos afetos e dos pelicanos de Oregon.

Eu já estava lá pelos trinta e poucos aprendizados quando percebi que aquilo estava se tornando muito, muito pretensioso.

Do jeito que a coisa ia, com tanta coisa aprendida, eu acabaria por escrever o Manual do Homem Perfeito. Pior, baseado em mim mesmo.

Reli o que havia escrito e a ficha da impostura caiu. Aprender é fácil, sábio guru. Eu quero ver é pôr em prática o aprendido.

Aprender e não praticar é o mesmo que não aprender.

Envergonhado por ter aprendido tão pouco, desisti da empreitada.

Hoje, ao reencontrar o arquivo de texto por acaso, finalmente entendi o que se passava. O problema não estava nos aprendizados não aprendidos. Estava no título.

Assim, entre o desencanto da ignorância e a providência de um título, aquilo que já foi pretensão publica-se como confissão:



51 coisas que eu deveria ter aprendido em 51 anos de vida

1. Não tentar ser corajoso, mas sereno. Coragem é crispar as mãos e partir para a briga. Serenidade é ter a certeza de que saberemos agir em todas as situações conforme elas se apresentem. Respirar. Agir ou fugir.

2. Contentamento. Valorizar o que se tem não significa comodismo, mas uma atitude de gratidão perante a vida. Reclamar é para quem não aceita as regras do jogo. Em vez de xingar o juiz, o melhor é seguir em frente. Se possível chutar a gol.

3. Buscar apenas aquilo que vale a pena. É ridículo pensar que a vida nos foi concedida para que acumulemos objetos. Que o vil metal seja usado para acumular experiências. Grandiosa é a vida. Coisas são apenas coisas.

4. A vida é uma aventura. Cada dificuldade e cada vitória são capítulos dessa aventura. Sem abatimentos e lamúrias na derrota, sem euforia na vitória. O bom e velho caminho do meio, com uma ou outra loucura para sair da rotina e esquentar essa aventura de viver.

5. Não posar de vítima das circunstâncias. Nossa felicidade não pode depender do que não depende de nós. O problema (qualquer um) é sempre responsabilidade nossa. A solução do problema está sempre em nossas mãos. Somos os únicos guardiões da vida que nos foi dada.

6. Problema sem solução = problema solucionado. Vamos em frente. Em caso de perseguição, aconselha-se correr em zigue-zague.

7. Sempre cometemos os mesmos erros vida afora. E sempre tentamos as mesmas soluções. Seguir o mesmo caminho só pode dar no mesmo lugar. Inovar é o segredo. Pode até dar errado, mas ousadia já é vitória.

8. Atalhos são geralmente mais longos do que o caminho original. O caminho original é o caminho do certo, do justo, do honesto, do desinteressado.

9. O bem maior é a liberdade.

10. Consciência tranquila – primeiro passo para a liberdade.



11. Perder o desejo de agradar todo mundo. Ninguém consegue. Nem Deus - que tudo pode e pouco agrada.

12. Algumas batalhas devem ser lutadas até a morte. Ou até a perda dos dentes – o que vier primeiro.

13. Saber a hora de se retirar de uma batalha. Se o jogo é sujo, você vai acabar se sujando. Esqueça aquele carrinho por trás - melhor ir mais cedo para o chuveiro.

14. Algumas batalhas não merecem ser lutadas. A frase é velha e foi expressa ali em cima. Também é velha a mania de transformar uma fechada no trânsito em guerra mundial.

15. Outra dificílima: aprender que o diálogo é mais importante do que o debate. Debater exige uma visão certa, outra errada. O diálogo pode permitir uma terceira visão, além dos tradicionais conceitos de certo e errado.

16. Governos não devem interferir na vida pessoal de ninguém. A liberdade não foi dada pelo homem, pelo homem não pode ser retirada. O que cada um faz com próprio corpo, com suas atitudes, com seus hábitos, vícios e comportamentos só deve interessar às autoridades se, de alguma forma, o indivíduo representar um risco real à sociedade. Mesmo assim, a interferência somente deve ser admitida quando a sociedade não dispuser de instrumentos construtivos para prevenir ou reparar esses riscos.

17. A sociedade ideal seria a sociedade sem leis, sem regras, sem proibições. A resolução de todos os conflitos se daria sob a divina luz do Bom Senso.

18. Poucas verdades são tão universais: preconceito tem as raízes fincadas na ignorância.

19. A história é realmente um ciclo. Preconceitos do passado reaparecem nos filhos de quem preconceitos quebrou. Os jovens estão velhos. Mas pensam que são rebeldes.


20. A maioria dos preconceitos é fácil de rebater: o outro é o outro. Você não tem que gostar nem desgostar do que outro é ou faz. Você não precisa se importar com quem o outro se deita. Tudo isso só diz respeito ao outro e a ninguém mais. Relaxe.




21. Eu posso ser feliz com poucas posses e pouco dinheiro. Mas os que são infelizes com mais posses e mais dinheiro sempre me lançarão olhares de piedade. Ser feliz sob tais olhares é a verdadeira provação.

22. Somente a arte nos liberta da ignorância e da matemática.

23. Ter fé significa ausência de preocupações. Não faz sentido ter fé e desesperar-se. Desesperança e fé são antônimos.

24. Ter um destino, mas aproveitar a viagem. Enquanto não encontrar o par perfeito, enquanto não ficar rico ou famoso, apreciar a paisagem. Só é possível ser feliz agora.

25. Somos, a maior parte do tempo, vítimas da própria imagem. O extrovertido nunca pode estar pensativo, o tímido nunca pode dançar sobre a mesa. É essencial não incorporar essa imagem estática. Quebrar a imagem sempre que der na telha, rir das caras de surpresa ou reprovação.

27. Sim, há males que vêm para o bem. É preciso tempo para observar e perceber. É preciso paciência. Então será possível realizar conexões, examinar as razões do destino e admitir que, sem aquele mal, o bem jamais teria acontecido.

28. Tudo é psicológico. Os fatos em si não têm importância. O que torna um fato pior ou melhor é a maneira que cada um de nós o encara. Mesmo o cenário que eu encontrar depois da morte vai depender do meu estado de espírito no momento em que eu bater as botas. Se a culpa estiver presente, é possível que eu veja vultos e lamentos. Se a consciência estiver em paz, verei anjos, jardins e pedras preciosas.

29. Comunicação nunca é problema. Se duas pessoas desejarem se comunicar, elas encontrarão um jeito. Conheci um italiano e um polonês que eram amigos - e um não entendia a língua da outro.

30. “Não falo tudo o que penso, eu falo tudo o que ouso. E ouso cada vez mais à medida que envelheço.” Essa frase eu li há uns 20 anos numa entrevista de jornal. O autor ficará sem créditos, mas, para quem procura vantagens no envelhecer, ali está uma boa filosofia a ser seguida. A verdade deixa de vir de caso pensado. Passa a ser verdade instantânea, inesperada. A verdade começa a usar os que envelhecem como instrumentos para que seja dita.


shania-mcdonagh
31. Algumas verdades não precisam ser ditas. Especialmente as que não me dizem respeito.

32. Existe um jeito certo de apresentar um ponto de vista. Se meu objetivo é convencer o outro, então é preciso ouvir o outro, entender o outro e respeitar o outro. Depois, devo expor meu ponto de vista como se o objetivo não fosse convencer o outro. Se o outro não acreditar na minha verdade, não haverá santo que convença o outro.

33. A minha verdade é só a minha verdade. A verdade do outro é outra verdade, mas a convicção é a mesma.

34. Governos não vão mudar o mundo. Governos não querem mudar o mundo. Governos querem poder.

35. BOSSOCO - Bom Senso, Solidariedade e Cooperação - essa deveria ser a base de todas as sociedades.

36. Amar é uma merda. Não amar é pior.

37. Euforia e desespero são as duas faces da moeda do equilíbrio. É preciso manter a moeda em pé. Uma vez aprendida, a paz de espírito se encarregará de sustentar o eixo.

38. Já foi dito em verso, agora será dito em prosa. O poeta Manoel de Barros escreveu que “homem é rascunho de pássaro, não acabaram de desenhar”. Com toda a admiração que Manoel merece, homem é bem mais do que pássaro. Homem não precisa de asas. Pássaro algum alçaria os vôos que a imaginação humana é capaz.

39. É possível aprender qualquer coisa. Tudo o que se precisa é dedicação.

40. Pessoas mudam sim. Mas, para que mudem, sempre será preciso uma grande dor, uma iluminação súbita ou o testemunho de uma magnânima demonstração de humanidade. É nos sentimentos mais profundos que surge aquele estalo de realidade que nos obriga a ver com outros olhos.

42. A maioria das religiões age como se seus deuses fossem meros juízes. Os deuses estão lá apenas para recompensar o bom e punir o mau. Deus não pode ser caminho, mas destino. Não pode ser utilizado como uma ferramenta para resolver a vida. Através da vida, dependendo da forma utilizada para resolvê-la é que se chega a Deus. Essa é a verdadeira recompensa - porque deve ser bom demais estar em todo lugar.

41. Deus é indescritível.



42. Poucos arrependimentos são piores do que o arrependimento de não seguir a própria intuição.

43. Meditação é o caminho para a consciência, para o bem estar, para a sabedoria e para a serenidade.

44. Consumismo é o mal do mundo. Consumismo é o eixo torto da sociedade em torno do qual giram a vaidade, os vazios de cada consumidor, os interesses da classe dominante, a valorização da coisa e do dinheiro, a ostentação e as desigualdades sociais.

45. Quando criança, eu tomei a seguinte decisão: “Eu jamais vou dizer que criança não pensa. Vou ter 80 anos e vou continuar sabendo que criança pensa sim.” Venho mantendo a promessa. Crianças podem até não saber expressar aquilo que pensam, mas que aquelas cabecinhas dão voltas, disso você pode ter certeza.

46. A verdade liberta. A mentira aprisiona. Omissão da verdade não significa tecnicamente mentir, mas pode aprisionar tanto quanto a mentira.

47. Trabalhar no que dá prazer é uma dádiva. Nenhum dinheiro paga décadas de insatisfação e paletós.

48. Quem deixa a terra natal jamais será completo - mesmo que voltar. Para o resto da vida vai faltar algo que aqui estava e não está mais. Quanto maior o número de endereços, mais incompleto será. (No fundo, quem permanece no torrão natal também será incompleto. Porque vai sentir saudade das pessoas que partiram. E até das que não conheceu.)

49. A certeza é inimiga da sabedoria. Ninguém deveria ter pressa para adotar verdades. É preciso perguntar muito, para muitas pessoas, em muitos lugares e por muito tempo. Somente depois - se preciso - convém abraçar uma ou outra convicção.

50. Pessoas são pessoas em todo lugar. Diferentes culturas e idiomas, diferentes modos de viver. Mas os mesmos temores, as mesmas dúvidas, as mesmas diferenças.

51. Aldous Huxley dizia que o cérebro não produz nada, que o cérebro é apenas um filtro para as idéias que vagam por aí. Se mantivermos as malhas desse filtro muito fechadas, apenas idéias pequenas podem entrar. Se, ao contrário, permitirmos que as malhas do filtro se expandam, estaremos dando acesso às grandes idéias. O principal responsável pela redução das malhas do cérebro é o preconceito.


~~~~~~~~

Acabei de ouvir no History Chanel uma informação a respeito da moleira. Moleira é aquela abertura no crânio do bebê que facilita o nascimento e permite o crescimento do cérebro.

Fiquei surpreso e preocupado ao saber que a moleira somente se fecha totalmente ao completarmos 35 anos. Seria a moleira uma indicação física das tais malhas do cérebro que, na maioria dos casos, se fecham com o envelhecimento?

Será que depois dos 35 apenas se preservam velhos conceitos e aprimoram-se os vícios, deixando as novas idéias às intempéries, sem mais acesso aos interiores da caixa craniana?

(Poderia ser bem pior: no meio médico, diz-se que a moleira se fecha em torno do 9º e 15º meses de vida.)

O jeito é ficar atento e não depender de moleiras. Pescar idéias no ar, provar um novo sabor, ouvir o que nunca foi ouvido, olhar de outro modo e se desfazer do baú de hábitos e certezas.

Mas que raios a moleira veio fazer numa lista de aprendizados?

Veio refutar o afirmado lá na introdução. Veio dizer que aprender por aprender, sem preocupação com aplicação prática, pelo simples prazer de aprender, é um pouco como viver.

Não sabemos por que se vive, não se sabe para que serve tudo isso, mas continuamos a viver - pelo simples prazer de viver.