domingo, 28 de dezembro de 2014

SEMENTES - Prazer em Conhecer



Aqui em Sementes, neste país-cidade do Arquipélago de Utopia, no Pacífico Médio, o conhecimento constitui as bases da cidadania.


Univer-Cidades

Os prédios escolares cumprem função vital em Sementes. Toda a malha viária e estrutura urbana se desenvolvem ao redor das escolas e a elas se conectam.

A cidade é planejada para ser extensão da escola. Para a escola as pessoas se dirigem quando querem dialogar, deliberar ou simplesmente encontrar interlocutores para uma boa conversa.

Aprende-se em todo lugar, porque obter conhecimento é a principal forma de lazer. Nos grandes espaços para atividades, crianças, jovens e adultos manuseiam mapas, livros, computadores, telas, tintas e pincéis. Também se valem de instrumentos musicais, ferramentas de pedreiro, carpinteiro e dentista, flores, árvores, tubos de ensaio e tudo mais com o que se possa aprender.



Escola sem professores

Em Sementes não se desperdiça tempo em frente a quadros negros, não se limitam experiências a quatro paredes impessoais, não se confina  o conhecimento nas verdades de um professor.

Porque todos são alunos e professores, porque todos têm algo para transmitir a alguém.

Orientadores circulam entre os grupos, sugerem fontes de pesquisa, promovem contatos, estimulam a interação e a criação de redes de conhecimento. Com frequência promovem debates e propõem questionamentos.


Conhecimento Intelectual e Corporal

Trabalho intelectual e trabalho manual são igualmente importantes. Em Sementes ninguém conhece a frase “se você não estudar, vai virar gari”.
Gari e médico têm o mesmo valor. Se o primeiro cruzar os braços, não há médico que contenha os danos à saúde pública.

Para ser médico é preciso estudo específico, mas é comum que garis deem palestras em cursos de medicina – normalmente sobre profilaxia.

(Garis também funcionam como agentes de saúde. Não apenas recolhem o lixo, mas orientam a respeito de reciclagem e do melhor aproveitamento de alimentos, alertam sobre os males do desperdício e do consumo irresponsável).



A Escolha da Profissão

Ao escolher um ofício, o único guia é a vocação, a única tutela é o desejo.

Como a divisão da riqueza se dá equanimente entre capital e trabalho e entre todas as profissões, o salário nunca será impeditivo para a consumação de talentos – tampouco servirá de estímulo. Dinheiro simplesmente não entra nessa conta.

A ideia de competição não faz sentido em Sementes. Todos entendem, desde cedo, que o bem comum e o bem individual estão interligados, entendem que cooperação é o caminho mais sábio a ser percorrido.



Auto-suficiência

O mesmo valor que se dá à cooperação é concedido à auto-suficiência.

Todos desejam aprender a costurar, cozinhar, consertar motores, construir casas, cortar cabelos, plantar...

É comum que se tenha várias especialidades. Alguém pode ser jardineiro, carpinteiro cirurgião e babá. E ainda fazer poesia nas horas vagas.



Debates

As discussões não visam sacramentar o que é certo ou errado. Não existem pontos de vista estáticos. No foco está a descoberta, a satisfação em encontrar sentido em opiniões conflitantes.

Aqui em Sementes, conceitos se entrelaçam porque é sempre preciso ultrapassá-los. Aqui em Sementes, existe apenas uma certeza absoluta: o pensamento é a mola evolutiva do homem, é através dele que se vai além do conceito aprendido.

Não se busca erudição, mas conhecimento prático do que já foi dito, escrito ou provado. Somente assim será possível dizer diferente, escrever o novo e apresentar as novas provas de uma nova realidade.



Ensino Religioso

Não existem templos em Sementes. Nem padres, nem pastores, nem guias ou mestres espirituais. O homem de Sementes não precisa de intermediários para interpretar escrituras, relatos e experiências.

Aprendem-se a história, os dogmas e preceitos de todas as religiões.

Tudo pode ser discutido, não existem assuntos tabus. Assim, religião é motivo para longos debates.

Considera-se, em Sementes, que o cérebro humano em sua conformação atual é insuficiente para assimilar as delicadas estruturas que se manifestam além da palavra e do raciocínio lógico.

Por isso, religiosos e agnósticos, crentes e ateus esmeram-se em encontrar o maior número de perguntas, uma vez que respostas são mutáveis, relativas e, em muitos casos, limitantes.

Alguns procuram experiências místicas e dizem encontrar respostas, mas respostas são sempre consideradas individuais.

Meditação (dissociada de qualquer culto) é prática rotineira e representa o eixo de uma máxima aplicada em Sementes: A serenidade é mais sábia do que a coragem.

No geral, tende-se a acreditar que Deus é um infinito conjunto de frequências. O bem-estar e a serenidade apenas serão encontrados se estivermos em sintonia com as frequências do bem (amor, caridade, compaixão).



Ano Letivo, Exames, Níveis...

Estuda-se durante a vida inteira. Assim, não há necessidade que se estabeleçam níveis.

Não há exames - o aluno é quem precisa estar satisfeito e sentir-se seguro com o próprio rendimento.

Idade não é parâmetro. Não há pressa. Aos orientadores cabe a tarefa de ajudar com o próximo passo, nunca a tarefa de introduzir precocemente estudos mais complexos.


Filosofia e Imaginação em Tempo Integral

Problemas cotidianos são discutidos sob a ótica filosófica, enfatizam-se as questões éticas da relação entre os homens e destes com o meio ambiente.

Valorizam-se os insistentes por quês das crianças. Imaginação e senso crítico são encorajados desde os primeiros textos. Exagerando um pouquinho:

- Vovô viu a uva.
- E a uva? A uva viu o vovô? Como é o vovô que a uva viu?

Elogios a progressos nos estudos não são recomendáveis. Elogios apenas estimulam a vaidade -  e vaidade intelectual se equivale à ignorância em Sementes. Repete-se ad infinitum a máxima de Sócrates: “Só sei que nada sei”.

A ideia é participar da alegria de quem aprende, enfatizar o prazer do conhecimento e exibir as portas que se abrem para o novo.



Interpretação de Textos - Uma Rotina

A partir da aquisição de certa capacidade de interpretação de textos, algumas perguntas tornam-se rotina:

Há algo que o autor não expressa no texto, mas que pode ser lido nas entrelinhas?

Por que o autor escreveu o que escreveu? Teria ele algum interesse pessoal / político / social?

O autor está realmente dizendo o que parece dizer? Ou usa ironia para dizer o contrário do que na verdade pensa?

Quais são os outros trabalhos do autor? Apresentam coerência quando comparados? É preciso que sejamos coerentes?

Pode-se confiar em eventuais dados apresentados? O autor cita fontes?

A quem se dirige o texto?

Quantas frases resumiriam o texto? Uma? Duas? O texto pode ser resumido ou somente faz sentido com as exatas palavras do autor?

A importância que se dá à análise de textos desenvolve o senso crítico, a capacidade de ponderar, abstrair e compreender as camadas que se sobrepõem para formar um idioma.

Também por isso, dá-se grande importância ao estudo de idiomas estrangeiros. Aprender outras línguas propicia conexões cerebrais e associações que estimulam o pensamento sutil, a compreensão de que nem tudo pode ser dito e pensado quando se fala e se pensa numa língua única.



História

Aqui em Sementes, a realidade aparente não se apresenta como única realidade possível. A realidade é um tecido maleável, é possível transformá-la.

Heróis não são valorizados e não se acredita em profetas.

A história ainda está para ser feita. A história dos livros mostra (ou encobre) erros e acertos do passado - é preciso entender uns para buscar os outros.



Tempo para Estudos

Tempo não é problema em Sementes. Uma vez que consumismo é desencorajado e posses não são consideradas sinais de status, ninguém trabalha mais do que precisa para comprar ou produzir o que ninguém vai usar.



Riqueza

Todos têm necessidades básicas supridas, todos têm conforto, ninguém anseia por luxo.

A riqueza é imaterial, mas tangível. Não se discute preços, mas valores.



Quem Cresce é o Homem

Sementes plantadas, frutos colhidos, essa univer-cidade permite-nos a ousadia de crescer mais do que cresce um lugar.

Se você, por acaso, encontrar-se um dia errando por aqui, nestas ilhas do Pacífico Médio, venha conhecer Sementes.

Faça turismo, conheça nossa gente, questione, compare, desconfie. Pense. 

Ao voltar para casa, arregace as mangas, releia os clássicos, as escrituras e o manual de carpintaria.

Aprenda tricô e reconsidere a teoria da relatividade.

Mas não se demore. O tempo urge para quem ainda não cultivou a roça dos aprenderes.

Não espere pelo terreno propício ou pela perfeita estação. Plante suas próprias sementes agora e para sempre. Elas saberão suprimir as ervas daninhas da vaidade, da gula, ignorância e irreflexão.